JORNAL DA SERRA DA CANTAREIRA

 

 
       




 

 

 
 
 

 

 

Cultura e Ambiente



 
No prefácio da 3ª edição de seu livro "Amazonas Pátria das Águas, o poeta amazonense Thiago de Mello escreve:
"Um temor grande se ergue das funduras das águas e percorre o verde corpo ferido da Amazônia: a nossa floresta está, devagarinho, tomando o rumo do fim. Confesso que escrevo estas palavras arrepiado. O que a Natureza levou milhões de anos para construir pode vir a ser destruído dentro de pouco tempo pela insensatez humana: a maior floresta, o mais lindo pedaço verde da Terra".
 


Filho da Floresta,
protegido das divindades,
poeta do Amor e da Esperança.
Sentimentos que, aliados a uma profunda consciência, o fazem mergulhar de corpo e alma na causa pela Amazônia.

Em sua vida, como escreve seu amigo, o jornalista Rogério Scavone, ”tanto observou terras distantes e as belezas da natureza, como testemunhou cenas dramáticas da miséria, da violência e da injustiça” (...) em ”tempos difíceis, que a memória e a indignação não deixam esquecer”.
Thiago de Mello vive hoje junto ao rio Andirá, na terra em que se fincam suas raízes.

No final de maio, durante o Fórum Sustentar, em Campinas, proferiu uma breve, lúcida e aplaudida palestra; também leu este poema inédito, que generosamente ofereceu para ser publicado no Jornal da Serra.

É UMA QUESTÃO DE AMOR

Thiago de Mello

O que é o meio ambiente?
É simplesmente uma casa,
só que grande  já demais.
Do tamanho do universo.

Dentro dela cabe o mundo,
mundo, mundo, vasto mundo,
cabe o sonho azul profundo
e mais, do que tudo, cabe
o amor que  essa casa  tem.

Amor: dar e receber.
A Casa gosta é de dar,
sabe que é sempre a  melhor
 maneira  de  receber.

O  seu  nome é Terra,
céu e chão  da  Natureza,
 mãe da sombra e do esplendor,
do  orvalho  e do  temporal.
 É a Gaia do  mito grego.
Já  não é mais um segredo
que  ela é um ser  vivo  também.

E vive  de  inventar  vida.
Cada coisa  que ela cria,
pássaro, nuvem, lajedo,
 oceanos, constelações,
 a luz do dia e a da noite,
é pra dar contentamento
 a quem  mora  nela  e  dela.

Sua invenção mais poderosa?
O  manancial  que  não  cessa.
Sua glória e sua festa
é ter plantado a Floresta:
pátria de todas as águas,
verde de todas as cores.
Mãos  de mágicos poderes
Prontas  sempre a bem servir.
Vôo sereno de garças
ensinando paz aos homens.

De gavião e bem-te-vi,
de coruja anoitecida
dando adeus paras as estrelas.
De caboclo plantador
de mandioca pra farinha.
Da sardinha ao peixe-boi,
da argila escura ao diamante.
De boto de olho na moça
tomando banho no rio.
De tudo a Floresta faz
um  jeito para  ensinar
a  magia de viver.

Mas da multidão de seres
que ela gerou, cuidadosa,
de todos o seu predileto,
o Humano, feito e perfeito
das virtudes dos seus verdes,
o único a quem deu o dom
de se indagar e escolher,
mal nascido,  a  malquerença
da cobiça o converteu
em  maldoso  Desumano:
animal ímpio,  feroz,
que lhe vem  varando  o ventre
com  lâmina  envenenada
de gaz, fogo  e  ingratidão.

A Terra sabe  ser  mãe.
Queimada e compadecida,
persiste fiel à bondade,
que é  seu destino e  seu dom.

 Ela te ama e estende a mão
a ti filho da Floresta,
a mais luminosa benção
que a Natureza te deu.

Dos seus âmagos em brasa,
das flores desarvoradas,
das asas enlouquecidas,
quando anoitece
                               - ouve bem -
Se  ergue um pungente clamor.
Não é grito de guariba,
não é esturro de onça
nem silvo do Curupira.

É a mata pedindo ajuda.

A Floresta é a tua casa,
cuida dela com amor.

 
                                    Rio Andirá , Barreirinha,
                                   No coração do Amazonas
                                                      2008